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Sites narrativos de web arte
CONTINUAÇÃO
Sanctu
trata-se de um trabalho que parte de várias traduções
para o meio digital de trabalhos do pintor Miguel Ângelo
da Caravaggio (1573-1610) - considerado um dos grandes mestres
da pintura por seu naturalismo exacerbado. Logo na entrada, o
internauta depara-se com seis pequenas figuras que se assemelham
muito a ícones típicos de interfaces gráficas,
como os sistemas operacionais OS Macintosh e Windows. As figuras
são pequenas amostras de desenhos "pixelados"
- criados no computador - de imagens sacras de santidades femininas.
No seu próximo nível, Sanctu, irá adentrar
mais a fundo cada uma das imagens sacras, tornando-as muito maiores
e justapondo-as com interferências ao redor da imagem maximizada
que suscitam referências a uma moldura ou qualquer tipo
de margem espacial para a figura.
A salvação dos arquivos
- Os artistas brasileiros Celso Reeks e Thiago
Boud'hours, do premiado "LandsBeyond", criaram
o site "Sanctu" onde estabelecem seis formas de
chegar a santidade. Este site parte de figuras sacras criadas
no computador e influenciadas por pelo pintor Caravaggio
(1573-1610), que propõem caminhos ao internauta.
Vários trabalhos da dupla podem ser vistos no site
Distopia: http://www.distopia.com
. Visitado em 11 de agosto de 2000 . |
Certamente, mesmo que comecemos agora a levantar possíveis
referências a metáforas da própria rede neste
trabalho - ressaltando assim o caráter metalinguístico
do site - fica muito visível que a intenção
principal é discutir a relação da pintura
com o meio digital mas sem aprofundar dentro de nenhum dos dois
meios. Aqui, a figura principal é a relação
e a tradução de suportes, transpondo informações
visuais e alterando formas em virtude da linguagem do novo suporte.
Porém, em segundo plano, é possível adentrar
o conteúdo semântico que envolve as obras de Caravaggio:
seu universo são imagens sacras que constituem-se verdadeiros
símbolos religiosos para a época do artista em questão.
A sacralização de uma imagem pode ser resultado
direto de duas vertentes básicas: por se tratar de um objeto
de culto religioso (como uma pintura que representa uma situação
que envolva uma santidade) ou por se tratar de um objeto artístico
de original único. A produção de Caravaggio
se encaixa nas duas possibilidades. Antes da fotografia, toda
a arte basea-se em um original único - excetuando a gravura
e suas derivações - sacralizado por ser "o
autêntico". Já no meio digital, mais especificamente
na Internet, teremos criações artísticas
que, simplesmente, não possuem original:
"Se a fotografia e o cinema causam o primeiro abalo na
idéia de autenticidade artística, a Internet chega
para destruí-la de vez. Uma obra criada para a rede é,
por definição, infinitamente reprodutível.
Quando tratamos de arquivos computadorizados ou de clones, como
distinguir os falsos dos originais? As facilidades da cópia
digital através de Web estimulam o uso indiscriminado de
'referências''. (Anderáos,1998, texto
da curadoria de web arte da 24ª Bienal de São Paulo)
Assim, temos em Sanctu muito mais do que releituras de antigas
pinturas: é uma discussão velada da arte sacralizada
e sua posterior dissolução com os novos meios e
linguagens que possibilitam uma reprodutibilidade que não
distingue cópia do original. Assim sendo, a Internet é
um dos maiores exemplos disso, já que, como já foi
dito, a cada novo acesso a um site qualquer disponível
na web, estaremos criando uma nova cópia de seu conteúdo.
Utilizando técnicas muito distintas de Sanctu, temos outro
site narrativo de Web Arte que também parte de princípios
definidos em outros momentos da arte, para desenvolver a sua poética.
Trata-se do site MoveMaker,
de Rejane Cantoni, que neste trabalho, criou espaços sob
a influência da Arte Op.
MoveMaker: Arte Op do ciberespaço
MoveMaker
da artista brasileira Rejane Cantoni fundamenta-se nos princípios
de relação com o espectador da Op-arte. Este movimento
artístico, também chamado de arte óptica,
cria objetos artísticos essencialmente geométricos
que elevam o ato da percepção visual, ao passo de
que a experiência do espectador se dá a nível
óptico, normalmente pela contemplação de
composições de elementos modulares. Essas composições
são resultados de sistemáticos estudos de linhas,
cores e formas que criam efeitos visuais que renunciam a qualquer
necessidade de repertório.
Contemplação ativa
- Contemplação ativa - o trabalho
"MoveMaker" da artista Rejane Cantoni parte das
premissas ópticas da Op-arte para a criação
de seus espaços tridimensionais criados com VRML.
Aqui, da mesma forma que alguns trabalhos da arte óptica,
é possível ver efeitos visuais ao locomover
no espaço diante dos trabalhos - o que pode ser feito
sob os mais diversos ângulos. Esta criação
encontra-se no site Interlab, junto com o trabalho de outras
artistas. Visitado em 10 de Julho de 2000. http://www.pucsp.br/~cos-puc/interlab/in4/entrada.htm
. |
Tendo como conceito a Arte Op, Cantoni faz uso da VRML
(Virtual Reality Modeling Language) para a criação
de espaços em terceira dimensão que serão
explorados pelo visitante de diversas maneiras. O programa de
visualização deste tipo de espaço permite
a locomoção, a aproximação, o distanciamento
e a assimilação sob inúmeros pontos de vista
dentro do que fora determinado pela artista. O visitante, logo
na entrada irá se deparar com inúmeras figuras geométricas
- algumas animadas, outras estáticas - onde estabelecem
links para outras partes mais "específicas":
um espaço irá dispor somente de linhas modulares
e outro se constituirá da somente modulação
de pontos. As cores usadas em alguns elementos não são
representativas dos conteúdos que reservam, mas servem
prioritariamente para distinguir uns dos outros, diante da similaridade
de formas entre cada um deles.
A artista busca com o uso dos elementos tridimensionais virtuais,
a mesma interação que o trabalho de Arte Op propõe:
as variações dos elementos acontecem de acordo com
a movimentação do espectador pelo espaço.
Diferentemente de outras correntes artísticas, aqui, como
na arte óptica, não existe a necessidade de qualquer
tipo de repertório para a assimilação do
trabalho: o visitante entra com o "hardware" necessário
- computador e seus olhos - e interage da maneira que preferir.
MoveMaker, a exemplo de muitos outros sites narrativos de Web
Arte, utiliza-se da Internet e seus recursos como uma poderosa
ferramenta para viabilizar e concretizar um conceito desvinculado
do ciberespaço. O artista multimídia e fotógrafo
Arthur Omar define a rede como um instrumento disponível
para as artes:
" O verdadeiro ambiente da arte é a mente, e nesse
ponto nada mudou com a arte eletrônica.(...)A grande diferença
é que com o advento do computador, o instrumento e a matéria
a ser transformada passaram a ser uma coisa só".
(Folha de São Paulo, Informática, 09/06/99)
Assim sendo, uma grande parcela das criações de
Web Arte estão intimamente ligadas com outras linguagens
e suportes e com as referências do espaço temporal
em que nos encontramos: nosso idioma, nossas lembranças
e nossos conhecimentos adquiridos. Assim como, outras expressões
do pensamento artístico contemporâneo, a Web Arte
pode evitar a auto-referência - falar de si mesma - para
tornar-se mais cada vez mais ligada a outras áreas do conhecimento
humano.
Este texto é parte integrante
do Trabalho de Conclusão do Curso de Bacharelado em Artes
Plásticas “Web Arte no Brasil: A arte telemática
criada por artistas brasileiros para a Internet”, realizado
sob a orientação do Prof. Dr. Milton Sogabe na UNESP
– Universidade Estadual Paulista. Esta pesquisa em nível
Iniciação Científica contou com
o apoio da FAPESP.
© Fábio Oliveira Nunes: entre
em contato.
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