|
Como definir a web arte?
CONTINUAÇÃO
Abre-se um caminho em que o hipertexto
– os links e seus infinitos percursos – se aproxima
da chamada multimídia – imagem, som, texto e vídeo
em um mesmo documento – formando-se a hipermídia
. Os sites perdem, pouco a pouco, seu caráter mais textual
e estático para se tornarem espaços dinâmicos
repletos de recursos que criam interfaces mais amigáveis
e mais ricas visualmente. A quase infinidade de recursos que
esse tipo de software possibilita, por um lado cria a mesma
fascinação que se faz diante dos recursos de editores
de imagem, que ao toque de alguns botões, tornam a imagem
original irreconhecível. Por conta da primazia técnica,
muitas vezes, produções de design em hipermídia
são consideradas – equivocadamente – de faturas
artísticas.
É certo que por conta de ser um meio ainda sem paradigmas
muito bem definidos como é a Internet, a fronteira entre
uma e outra categoria – web arte e design – ainda
está sendo elaborada. Parte dessa indefinição
se dá pela pouca afinidade com trabalhos de arte que não
se aplicam à venda ou divulgação de algum
produto ou serviço. Embora o número de trabalhos
com intuitos não-comercias – e principalmente, com
graus de subjetividade que distanciam enormemente uma coisa da
outra – seja cada vez maior, esta generalização
ainda deve estar presente por algum tempo.
1.2 Web arte: Experimentações artísticas
produzidas para a Internet
1.2.1 O universo da arte e novas mídias
Deixando de lado o substrato tecnológico da web arte,
primeiramente é interessante considerar o contexto artístico
em que se inserem estas produções em questão.
Várias denominações, tais como: Arte e Tecnologia,
Arte e Novos Meios, Arte e Novas Tecnologias, Arte e Novas Mídias
e Arte Tecnológica, se aproximam ao determinar as experimentações
artísticas realizadas em suportes eletroeletrônicos,
digitais ou biotecnológicos. Sobre a criação
em meios eletrônicos, PLAZA e TAVARES (1998:63) definem:
“Nos processos criativos com estes meios, a qualidade
é evidenciada como compromisso estabelecido entre a subjetividade
daquele que inventa e as regras sintáticas inerentes aos
programas por ele utilizados. Estas tecnologias, ao participarem
deste tipo de criação, instituem-se como forma de
expressão, manifestada pelo diálogo entre a materialidade
do meio e o insight criativo. É a partir deste diálogo
que se revelam as diferentes poéticas. Os meios eletrônicos,
representados pelo hardware e pelo software, são responsáveis
por amplificar as capacidades cognitivas – sensíveis
e inteligíveis – do criador, caracterizando, portanto,
uma prática fundada em um permanente diálogo entre
o individual e o coletivo. Impõe-se ao artista novas regras,
que dele exigem uma familiarização com os modelos
tecnocientíficos em uma interligação de práticas
e saberes (techné + logos) disposta em relações
interdisciplinares.”
A prática da produção artística em
novas mídias pressupõe um conhecimento prévio
das tecnologias empregadas seja por parte do artista ou pela equipe
interdisciplinar a qual participa. Embora aparentemente isso possa
criar paralelos com a produção artística
em suportes mais convencionais – toda técnica exige
um conhecimento prévio – é certo que ao lidar
com os novos meios, há a exigência de um conhecimento
muito mais objetivo e específico. Além disso, o
conhecimento técnico é um excelente aliado para
desvelar a estrutura do meio em questão.
Voltando-se para as experimentações artísticas
para a Internet, podemos localizá-las no interior de um
dos campos da arte e novas mídias: a arte telemática
– termo que une telecomunicações e informática
– junto a outras experimentações com meios
próximos como o fax, a Slow-Scan TV e as redes computacionais
anteriores a popularização da Internet, como o videotexto.
Porém, com a hibridização de conceitos, é
possível encontrar trabalhos que partem de outras categorias,
como a bio art ou a arte robótica que apropriam da estrutura
e linguagem das redes.
1.2.2 Definindo Web Arte
Mantendo-se distante dos subjetivos conceitos que legitima o
produto de um trabalho como arte, podemos então definir
como web arte aquela produção que é pensada
levando em consideração o campo de significados
e as especificidades da Internet. Muitas vezes apresenta-se como
um espaço pontual na rede mas também pode fazer
referência a espaços físicos remotos. Diferentemente
dos sites de divulgação, as chamadas galerias virtuais
que utilizam a rede como “estrutura”, a web arte apresenta-se
na rede como “obra”, conforme define Gilbertto PRADO
(1997a):
“Sites de realização de eventos e trabalhos
na rede: Nos (...) grupos que citamos acima (sites de divulgação),
as redes são sobretudo ‘estruturas’, nos dois
grupos que se seguem elas intervêm mais como ‘obra’.
Essa participação pode ser compartilhada diretamente
com outros ou ser desencadeada a partir de dispositivos particularmente
desenvolvidos e direcionados para esses eventos. Por esta classificação,
não queremos dizer que os artistas sejam definidos por
uma única forma de trabalhar como sua característica
exclusiva. As diferentes aproximações artísticas
de produção em rede não se excluem, elas
são algumas vezes complementares e geralmente concomitantes.
a) Dispositivo: É uma estrutura em rede estendida em diferentes
locais, onde o espectador e/ou artista agem – sem estar
em contato com outras pessoas – diretamente sobre o dispositivo,
para iniciar uma ação. O trabalho artístico
se estabelece com o desencadear da ação que é
proposta pelo artista, conceptor da ‘obra’ e que se
inicia com a participação do espectador.
(...)
b) Interface de contato e partilha: Trata-se também de
formações efêmeras de redes, mas nas quais
os trabalhos existem somente e graças a diferentes participantes
em locais diversos. Não é somente a noção
de fronteira que é quebrada, mas também o desejo
de estar ‘em relação’ com outros. As
redes nesse caso são utilizadas sobretudo com a intenção
de um trabalho coletivo e partilhado.”
1.2.3 Efemeridades
A produção em web arte necessariamente está
ligada ao campo de significações que a rede suscita
e também as especificidades técnicas e conceituais
que nela se inserem. Primeiramente, a produção em
web arte é calcada na efemeridade: a tecnologia, em caráter
de atualização permanente, a cada instante proporciona
um número maior de possibilidades – e de problemas.
A constante atualização de software e hardware cria
uma gama gigantesca de máquinas conectadas a rede com diferentes
características e embora haja muito de universal em todo
o processo existente na Internet – da HTML aos protocolos
utilizados entre os computadores – ao lidar com pormenores
estéticos, torna-se impossível determinar com precisão,
a visualização e funcionamento no computador visitante.
Diante das inúmeras características do computador
visitante,o artista – levando em consideração
as propriedades do seu trabalho – pode formatar a sua produção
para um usuário médio ou mais comum, tendo muitas
vezes que abrir mão de particularidades ou tecnologias
que não seriam acessíveis para essa média
de público ou então, simplesmente definir uma configuração
a que se encaixe em seu projeto, sem fazer concessões.
É bom salientar que estamos nos referindo a questões
técnicas, sempre transitórias, o que pode interferir
no acesso para um maior público somente por um curto espaço
de tempo.
Ainda no campo das efemeridades, temos na rede o estabelecimento
de um outro tempo: as informações envelhecem em
grande rapidez. O novo pode se tornar antigo em poucos meses.
Uma interessante metáfora a esse outro tempo dado no interior
da rede é vista em “Cronofogia”
(2002) de Kiko Goifman e Juradir Muller, onde foi criado um “relógio
web”. O envelhecimento e morte de uma imagem – localizada
no centro da página – são dados pela ação
conjunta de usuários: é necessário um determinado
número de cliques para a ação se consumir
de fato. O tempo de sobrevivência é dado pela própria
rede.
1.2.4 O tempo real
Por outro lado, o tempo das redes é o tempo real. Seja
por meio do fluxo informacional incessante – lidando cada
vez mais com um presente se tornando passado – seja pelo
uso do tempo simultâneo, do tempo “ao vivo”
– familiar denominação dada pela cultura televisiva.
Vários artistas buscam explorar esta instância em
suas experimentações, mas na rede – muito
diferente da cultura broadcast – a transmissão em
tempo real está muito mais relacionada com imagens de sistemas
de vigilância, numa linguagem que abarca alguns aspectos
da contemporaneidade.
Caça-fantasmas
– O site GhostWatcher (1996) propõe aos corajosos
internautas que se disponham a vasculhar os cantos do quarto
de June Houston atrás de temíveis fantasmagorias.
Daí, os mais valentes reportavam aquilo que foi visto
– ou imaginado – pelas câmeras por ela,
disponibilizadas. O site atualmente (em julho de 2005) está
off-line. |
Um trabalho muito conhecido – de uso de imagens em tempo
real através de imagens estáticas é “Ghost
Watcher” , onde a artista propõe aos visitantes
que através das imagens de câmeras posicionadas debaixo
de sua cama, elaborem relatórios sobre o que viram. Há
várias câmeras distribuídas pelo espaço,
podendo-se vigiar sob diversos ângulos.
Parte integrante da dissertação
de mestrado "Web Arte no Brasil: algumas interfaces e poéticas
no universo da rede Internet", realizada sob a orientação
do Prof. Dr. Gilbertto Prado, na UNICAMP.
© Fábio Oliveira Nunes: entre
em contato.
|