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Uma internet para os artistas
CONTINUAÇÃO
As experiências artísticas utilizando-se de redes
já datam de algum tempo. Antes do computador, os artistas
criaram a arte postal nos anos 60. Depois disso, com os avanços
no campo dos satélites e das transmissões eletromagnéticas,
aliadas com um desejo de realização instantânea,
começam as primeiras experiências artísticas
utilizando-se de artefatos eletroeletrônicos como a televisão
de varredura lenta (Slow Scan TV), o telefone, o fax, e as redes
de computadores que de início eram estabelecidas somente
para eventos determinados e logo a seguir desfeitas. Da associação
das telecomunicações com a informática, surge
o termo telemática, que ainda hoje é utilizado para
designar trabalhos criados nas redes de computadores como a Internet
(arte telemática).
Quando comparada com a fotografia, é impressionante a rapidez
com que a Web Arte, em menos de cinco anos, chega ao circuito
internacional de arte contemporânea. Hoje, esse novo meio
de arte que utiliza a rede mundial de computadores – a Internet
– está presente nos grandes acontecimentos das artes
– como a Bienal de São Paulo e a Documenta de Kassel
– mesmo ainda não sendo conhecida do grande público
ou do público da grande rede. O número de trabalhos
artísticos criados especificamente para a Web, ainda é
muito pequeno e são pouco divulgados. É muito maior
o número de sites que levam a insígnia “artes”,
por meio de galerias virtuais, museus on-line e portfólios
de artistas, ou seja, a maioria das citações artísticas
é referencial a pinturas, esculturas e instalações
que existem independentemente da rede.
A Web
Arte - a arte telemática produzida para a Internet
– tem como principal característica ser constituída
de trabalhos especialmente produzidos para rede ou que, ao menos,
utilizam a Internet como parte integrante da obra ou evento artístico.
A princípio não se possui ainda definição
ou vocabulário muito definidos.
Mas o que faz um artista escolher a Internet para a criação
de seus trabalhos artísticos? Essa é uma pergunta
a ser respondida por duas respostas diferentes, porém,
complementares. Uma é geral e é válida para
todos os meios. Outra é específica e considera as
mais diversas características da rede mundial.
Primeiro, temos que levar em consideração toda
a história da arte a que temos acesso hoje. Em todos os
tempos, os artistas sempre buscaram o novo para sua a época,
seja sob a forma de pensamento, seja sob a forma de técnica.
Sempre os pioneiros são lembrados e colocados para a posteridade.
Os exemplos são muitos, Marcel Duchamp, artista francês
conhecido por seus readymades, incorporou algo novo tanto em pensamento
e discurso poético como em técnica, ao colocar objetos
fora de seu contexto inicial, destituindo funções.
O mais conhecido de seus readymades é a Fonte (1917), que
é um mictório, típico acessório de
louça de sanitários masculinos, onde discute autoria,
aspectos da industrialização e o mercado de arte
da época. Questões pertinentes ao seu tempo, assim
como foi importante a vida moderna incipiente para os futuristas
e a irracionalidade da Segunda Guerra para o Dadaísmo.
Muito mais do que simples temas, os aspectos da época acabam
por estabelecer novas maneiras de entender e fazer arte. O Futurismo
incorpora às artes, a performance e os poemas barulhistas.
O Dadá faz uso de materiais diversos e o Neo-Dadá
cria a arte postal por meio de publicações dos participantes
dadaístas.
Assim, os artistas incorporam novas idéias e novos meios
relacionados ao seu tempo.
"O surgimento de novos meios tecnológicos de
produção audiovisual, principalmente os eletrônicos,
provoca uma influência de difícil avaliação
sobre as formas culturais tradicionais. Esses meios possuem caracteres
que renovam a criação audiovisual, reformulam a
nossa visão de mundo, criam novas formas de imaginários
e discursos icônicos ao mesmo tempo em que recodificam as
imagens dos períodos anteriores".(PLAZA e TAVARES,
1998: XV).
Mas novos meios não tornam obsoletos os antigos. O que
acaba existindo é uma reformulação de linguagem,
uma busca de novos objetivos. A pintura deixou de representar
o real assim que a fotografia se mostrou muito mais eficaz e rápida
para esse fim.
Por outro lado, temos muitos artistas buscando novas possibilidades
e experimentações. Os novos meios são ricos
em possibilidades nunca antes vistas. O coreano Nam June Paik,
em 1963, inverte os circuitos internos de um televisor para distorcer
as imagens recebidas, além de utilizar-se de um imã
para interferir no tubo de imagem. Essas experiências –
talvez despretensiosas para o artista –“dão
as diretrizes para todo o posterior desenvolvimento da arte do
vídeo e provoca uma reversão no sistema de expectativas
figurativas do mundo da imagem técnica” (MACHADO,
1988:117). Assim como Paik, outros artistas pioneiros contribuíram
para a incorporação de novas tecnologias nas artes.
No Brasil, o primeiro artista a identificar a arte computacional
com a arte contemporânea é Waldemar Cordeiro que
cria obras de cunho “industrial” e “construtivo”.
Artista em pele de engenheiro
– Waldemar Cordeiro, junto com outros artistas como
Julio Plaza e Abraham Palatik, é considerado um precursor
da arte computacional brasileira. Cordeiro foi um dos mentores
da arte concreta e organizou o célebre evento Arteônica
em 1971 – o primeiro evento de arte e tecnologia do
Brasil em grande porte – realizado na FAAP, em São
Paulo. Defendia que os artistas deviam ter um domínio
das linguagens de programação para tirar um
proveito completo da máquina. Acima, “A mulher
que não é B.B.” de 1971, computação
gráfica realizada conjuntamente com José Luiz
Aguirre e Estevam Roberto Serafim, professores de tecnologia
da Universidade de São Paulo (USP). |
A grande maioria dos artistas escolhe a Internet para a criação
artística por suas características específicas
tais como: uso da hipermídia, instantaneidade, interatividade,
imaterialidade, alcance mundial e reprodutibilidade infinita.
Muitas destas características já existiam antes
do advento da rede mundial de computadores. Mas é aqui
que todas elas se encontram em um mesmo meio. A Internet, sob
uma ótica regressiva, é uma soma dos veículos
de comunicação impressos (jornais e revistas), do
rádio e da televisão, podendo ainda ser encontradas
características do telefone, do fax e até mesmo
do cinema.
Parte integrante da dissertação
de mestrado "Web Arte no Brasil: algumas interfaces e poéticas
no universo da rede Internet", realizada sob a orientação
do Prof. Dr. Gilbertto Prado, na UNICAMP.
© Fábio Oliveira Nunes: entre
em contato.
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