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Uma internet para os artistas
CONTINUAÇÃO
Ao acúmulo de características de muitos meios –
imagens, sons, texto e animações – em um só,
dá-se o nome de multimídia. Esse termo pode adquirir
significados diferentes conforme o contexto em que é utilizado:
costuma-se chamar de multimídia, artistas que diversificam
sua produção em vários meios distintos. Com
a inclusão do Hipertexto e seus links na rede e em CD-ROMs,
a multimídia se torna hipermídia.
"O que distingue a hipermídia é a possibilidade
de estabelecer conexões entre as diversas mídias
e entre diferentes documentos ou nós de uma rede. Com isso,
os ‘elos’ entre os documentos propiciam um pensamento
não-linear e multifacetado. O leitor em hipermídia
é um leitor ativo, que está a todo o momento estabelecendo
relações próprias entre os diversos caminhos".
(LEÃO, 1999:16)
A busca do instantâneo pelos artistas inicia-se nos anos
sessenta, junto com o uso de suportes “imateriais”.
“Não se desejava mais trabalhar com o lento processo
de comunicação postal, era preciso fazer depressa
e diretamente, passar do assíncrono ao sincrônico”
(PRADO, 1997c). Assim, surgem as primeiras experiências
utilizando telefone, fax, telex, Televisão de Varredura
Lenta (Slow-Scan TV) e mais adiante, redes de computadores. Um
dos primeiros trabalhos artísticos realizados com o uso
de fax foi o evento - realizado nos EUA - N.E. Thing Co. Trans
Usi Connection Nscad-Netco, em 1969, onde houve troca de informações
via telex, telefone e fax entre a nova Scotia College of Art and
Design e Iain Baxter do N.E. Thing Co. . As utilizações
de sistemas semidigitais, como o Videotexto
, também foram recorrentes entre muitos artistas.
Tão perto dos olhos -
Entre as primeiras experimentações artísticas
explorando o potencial sincrônico nas novas tecnologias
da comunicação está “Hole in
Space” de 1980. Kit Galloway e Sherry Rabinowitz criaram
uma interface em tempo real entre as cidades de Los Angeles
e New York City (ambas nos Estados Unidos) que, como num
“vácuo no espaço”, tornavam presentes
as pessoas fisicamente distantes, em espaços públicos
das duas cidades. As pessoas de cada um dos locais se viam
através de um telão em tempo real. |
Na Internet, a instantaneidade é explorada principalmente
por meio das Web Cams - câmeras conectadas a rede mundial
que na maioria das vezes transmitem imagens ininterruptamente.
O artista Eduardo Kac vem desenvolvendo desde 1989 uma forma de
arte que denomina de “telepresence art”. Um dos seus
trabalhos mais conhecidos utilizando a Internet e Web Cams é
Rara Avis (1996) onde o observador via rede pode habitar virtualmente
um corpo de um pássaro-robô que se encontra dentro
de um aviário.
Diana Domingues define, como arte interativa, a produção
artística que “possibilitada pela inclusão
das novas tecnologias digitais nas práticas artísticas,
modifica e coloca novos modos de fruição para o
público. A intenção é propor o trabalho
artístico não mais como mera criatividade do autor,
mas como possibilidade de ser fruído, distribuído
em rede, conectado através de terminais de computador,
sempre solicitando uma ação num determinado ambiente
onde sensores, sintetizadores, mouses, teclados ou outros aparatos
que captam o corpo, fazem gerar novas situações
ao trabalho proposto pelo artista. Cada indivíduo pode
se conectar, agir, modificar, intervir”. Na Web e em
outros meios tecnológicos, a interatividade aliada a instantaneidade
de respostas a cada estímulo do indivíduo, “marca
a passagem da arte da representação para uma arte
muito mais comportamental” (DOMINGUES, 1997a). A arte
interativa não é só um resultado visual mas
também o processo no qual se insere o indivíduo.
A interatividade na Internet apresenta-se na maioria das vezes
nas decisões em textos hipermídia (utilizando-se
dos links clicáveis) e por ações em ambientes
virtuais.
A imaterialidade é outro elemento importante dentro do
discurso poético de artistas que produzem trabalhos especialmente
para a Internet – os web artistas. A busca por meios e procedimentos
imateriais dá-se início junto com a busca de meios
de propagação da informação de maneira
instantânea, como o fax, o telefone, o vídeo-fone,
a televisão e mais tarde, as redes de computadores. Todos
os meios de comunicação de escala global ou regional
juntos, criam uma trama informacional de caráter imaterial,
denominada ciberespaço. O termo é também
usado freqüentemente para denominar a própria rede
Internet, embora possua uma dimensão que a Internet ainda
não possui.
Telefones, celulares, rádio e televisão; infra-estrutura
de cabos de cobre ou fibras ópticas, ondas de rádio
e redes locais (Intranets, por exemplo) ou globais, tendo seus
terminais de comunicação ou suas informações
gerenciadas por computadores, formam o ciberespaço.
(DUARTE, s/d)
Esse novo conceito de espaço sem referencial físico
cria o que se pode chamar de ciberlugares, locais de troca de
informação e relacionamento que não acontecem
em espaços físicos mas em um fluxo informacional.
A melhor maneira de tentar entender esse conceito é pensar
onde ocorre um bate-papo via Internet: no conjunto de computadores
conectados a uma mesma sala de bate-papo, em cada um deles ao
mesmo tempo.
O alcance mundial da Internet é um dos pontos que a fazem
atrativa tanto comercialmente como para a disponibilização
de informações. “Perante a estrutura descentralizada,
abrangência global sem fronteiras geopolíticas e
fluxos codificados de informação, o controle na
Internet é não só tecnologicamente impossível
como também, por essas mesmas características, politicamente
inviável” (DUARTE, s/d). Para um internauta
no Brasil pouco importa se o site que ele acessa está na
França ou na Indonésia. Não há alfândegas
digitais, nem qualquer outro obstáculo para o fluxo informacional
global dentro da rede. Mas há exceções: algumas
nações como a China, que em 1996, bloqueou o acesso
a mais de 100 sítios internacionais, incluindo a revista
masculina Playboy e os principais jornais, revistas e boletins
de informações do mundo. Embora a tentativa do governo
chinês seja controlar o acesso a livre informação,
esse tipo de atitude não impede o acesso a outros sites
menos conhecidos de conteúdos “proibidos”,
demonstrando que a censura mais eficaz ao conteúdo da rede
é aquela que é feita pelo próprio usuário
por meio de softwares como NetNanny, que bloqueiam o acesso aos
sítios que contiverem determinadas palavras. Assim, ao
bloquearem a palavra sexo, estará bloqueando sites pornográficos,
mas, ao mesmo tempo, impedindo o acesso a sérias discussões
científicas sobre o tema. Mesmo assim, se a página
acessada tiver conteúdo pornográfico e não
possuir nenhuma das palavras censuradas pelo software, o computador
aceita normalmente.
“A Obra de Arte na era de sua Reprodução
Técnica” – um dos marcos da reflexão
crítica sobre a produção cultural –
ensaio escrito por Walter Benjamin em 1936, propõe uma
mudança nos conceitos da estética clássica,
acreditando que a possibilidade de reprodução quase
infinita das imagens altera o cerne da experiência artística.
Embora na época, Benjamin baseou-se principalmente na fotografia
e nos primórdios do cinema, muito do que foi dito por ele,
hoje vale para entender o que acontece na Internet, onde a cada
acesso, uma cópia é criada.
Benjamin entendia a reprodutibilidade como algo positivo, “por
desmascarar a ideologia elitista da estética ocidental.
Para ele, a arte não deveria ser pensada em oposição
à indústria cultural, mas dentro dela. E as tecnologias
seriam instrumentos para desmistificar teorias supostamente universais
do belo, mostrando que, na verdade, elas não passavam de
visões de classe sobre códigos socialmente compartilhados
de comunicação” (ANDERÁOS, 1997).
A reprodutibilidade seria o fim da arte aurática –
o culto ao objeto de arte único – e da autenticidade.
E na rede, onde um trabalho de arte pode ser infinitamente reproduzível
essas características desaparecem definitivamente.
É claro que não se pode resumir a escolha de um
artista por um meio em especial simplesmente por algumas características
gerais. É certo que a busca pelo novo, a instantaneidade,
a interatividade, o uso da hipermídia, o caráter
imaterial, o alcance mundial e a reprodutibilidade infinita são
pontos tão importantes quanto os motivos pessoais do artista
- como o baixo custo de divulgação de um trabalho
ou mesmo a maior facilidade de lidar com o computador. Nestas
considerações, passamos a falar sobre os trabalhos
de arte realizados especialmente para a Internet – a chamada
Web Arte.
Parte integrante da dissertação
de mestrado "Web Arte no Brasil: algumas interfaces e poéticas
no universo da rede Internet", realizada sob a orientação
do Prof. Dr. Gilbertto Prado, na UNICAMP.
© Fábio Oliveira Nunes: entre
em contato.
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